sexta-feira, setembro 12

A Aventura do Gelo

Consta que era um hábito da minha época, mas eu nunca fui e não tenho lembrança dessa coisa de "Hollyday on Ice". De toda forma, de repente começaram a pipocar uma tonelada de shows infantis "on ice" por aqui nos últimos meses. Como eu nunca tinha ido, nem acho lá muita graça nessa viadagem de patinação no gelo, o apelo pra mim era uma coisa próxima ao zero; e se eu já achava uma coisa meio gay, o que eu posso dizer sobre o ursinho Poo (que, quando eu era criança, chamava Puff) piruetando no meio de uma arena de gelo que não possa fazer deste post uma coisa mais preconceituosa?

Mas, então eu vi um anúncio no jornal de que haveria uma apresentação dessas d"As Princesas". Como é de conhecimento geral, a minha filha tem certeza - e eu faço de tudo pra que seja mesmo - de que ela É de fato uma princesa. De uma hora para outra, me render ao "on ice" passou a ser um compromisso inadiável. A minha princesa jamais me perdoaria se eu deixasse de levar ela para ver as suas ídalas - isso por si só, o que piorou bastante quando todas as outras amiguinhas dela também confirmaram que iam às apresentações, eu seria a maior bruxa de toda a história se não desse esse presente pra ela!

Os ingressos foram comprados e escolhidos para a primeira semana de apresentações, num lugar estratégico e mais caro, onde eu tinha certeza de que ela poderia ver tudo direitinho, ainda no mês de julho. O sigilo foi mantido até o início deste mês, porque eu tinha certeza de que se eu contasse que nós íamos ver As Princesas ao vivo e à cores, não teria mais sossego na vida até o dia do show. Dito e feito. Passei as duas últimas semanas ouvindo a pergunta todas as vezes que passávamos pelos cartazes espalhados pela cidade ou que ela conseguia ver o anúncio no jornal.

Nestas duas últimas semanas também, vale dizer, os ânimos andaram exaltados - de ambas - e nós passamos por um período meio punk.

Assim, com um sono super acumulado por noites mal dormidas, pela rotina que anda pesada, debaixo de um sol egípcio, chegou o grande dia.

Eu armei quase um esquema de guerra. Eu bem poderia ter ido de Metrô direto até lá, mas andei lendo no jornal que "aquela" passarela que leva até o Maracanã anda um território de ninguém, então esta primeira alternativa foi descartada imediatamente porque eu não sou mulher de pôr minha filhota em risco para poupar dinheiros - muito pelo contrário, sou mulher de deixar de fazer muitas e muitas coisas pra mim (e isso fui eu pensando na minha sobrancelha que está parecendo uma taturana) para dar o mundo pra ela.

A segunda opção era pegar um ônibus até lá direto, mas eu comecei a desconfiar que ia saltar no ponto errado, que ia ter que ficar rodeando o estádio perdida e submetida aos mesmos perigos da passarela - eu sou uma pessoa sem GPS, é fácil, fácil eu me desorientar.

Então, depois de consultar a mãe, a tia (que ligou prum outro tio, esse sim com GPS), ficou decidido que eu pegaria o ônibus do Metrô até o Metrô para saltar numa das estações da Tijuca e de lá pegaria um taxi até o estádio.

Não foi à toa que eu perguntei à ela: "Pronta pra aventura?".

Ela estava. Sempre está.

E realmente, foi a melhor coisa que eu fiz, esse plano de guerra. Enquanto o taxi rodava o estádio eu não me segurei e soltei "Ah, bem que eu sabia que não ia dar certo eu vir andando até aqui!".



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Como em todo show de grande porte, a banca de souvenires era um espetáculo à parte.

Um tal de varinha que brilha, espada que brilha, negócio que roda (eu não sei bem pra que diabos servia aquilo), bonequinho assim, bonequinho assado... Olívia ficou deslumbrada! Mas a mamãe aqui, que já está dura, só pra dar uma variada, e além disso tinha de fato levado pouca grana, chegou à conclusão de que existem um milhão de brinquedos disponíveis por aqui da franquia milionária para vender e que conseguia achar uns bens mais bonitos e baratos lá no Saara. Ela aceitou numa boa e, para não dizer que ela não ganhou nada, compramos uma pipoca que devia ter sido feita de milho de ouro para que ela pudesse, a partir de agora, ter o seu próprio balde de pipoca (eu tenho o meu do Cirque De Soleil e ela e o Arnaldo dividiam a propriedade do balde do Aragorn até agora); e um merecido souvenir desta tarde memorável - apesar dos preços e do meu bolso furado, toda criança merece um souvenir de um evento memorável como este, por mais chulé que ele possa ser.

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Nossos lugares não poderiam ser mais perfeitos!
As duas fileiras da frente que constavama como esgotadas quando fui comprar nossos ingressos, milagrosamente estavam vazias. Zit. Ninguém na frente. E, se eu tivesse comprado ingressos nelas, provavelmente a nossa visão seria prejudicada - logo, ponto!
Só foi foda chegar à cadeira e descobrir que atrás de mim estavam 4 lindas e minúsculas princesinhas, mas aí morreu o neves porque eu comprei o lugar e não dava pra deixar a minha princesa sozinha (até porque a minha ainda era menor que ela). Morri de culpa o primeiro ato todo (e as mães delas de raiva), mas no segundo elas pularam pra frente e ficamos todas mais felizes.

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E, como até eu tenho medo dessa minha deficiência de GPS, mesmo com a operação certa e cronometrada (esqueci de mencionar que eu cronometrei a operação, né?) de guerra, chegamos cedo a rodo. Pra mim, beleza, garantia de já estar no lugar certo, na hora certa. Eu fico agoniada com horas. Pra ela, uma espera sem fim. Relógio de criança é uma loucura! Esperar cinco minutos por algo que ela queira equivale a esperar umas cinco horas pelo nosso relógio; agora esperar por algo que você queira...
Enfim, após uma loooooooooooooooooooooooooooooooonga espera (no relógio dela; no meu foram só vinte minutos), um locutor avisou alguma coisa.
O início foi impossível de ouvir. A multidão - e olha que não estava lotado, eu olhei, tinham váááááários lugares vazios na parada; o que, aliás, era bem a minha intenção quando comprei ingressos pruma quinta-feira à tarde - berrava alucinadamente, flashes espocavam num balé que ia se repetir ao longo das quase duas horas que passamos lá dentro. Meu queixo caiu. Parecia show de rock. Só me lembrava de ter visto reações parecidas com, sei lá, New Kids On The Block (um ponto negro da minha biografia sobre o qual nós não vamos falar agora)!
A segunda parte eu entendi. Dizia que as pessoas não deveriam tirar fotografias. Muito menos com flashes porque isso poderia distrair os atores e eles poderiam se machucar. Flashes espocavam, lembram? Não deu tempo deu sentir vergonha de ser brasileira ou ficar indignada com a surdez seletiva e falta de educação do estádio inteiro. O show começou.
(E, de fato, o príncipe da Bela Adormecida veio a se esborrachar no meio do espetáculo, sem tirar o sorrisão congelado do rosto, levantando imediatamente. E o segundo aviso sobre "vamos expulsar vocês seus mal educados" não veio, como eu esperava que viesse.).

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E então eu entendi tudo.
Como é de hábito, Olívia permaneceu estática durante todo o espetáculo, com leves excessões para quando aparecia uma bruxa e para quando o príncipe enfiou o sapato no pé da Cinderela, quando ela me olhou, juntou as mãozinhas e soltou um "oooohh" debochado que me fez rir à beça; mas eu, eu parecia uma retardada.
Acabei de me lembrar como eu ri com as reações da minha mãe ao Circo do Solzinho e me envergonhar profundamente, porque, dessa vez, a ridícula fui eu!
Eu ficava lá, "Oóoóolha, miíinha fiíilha!", "Ôôôlííívia, óoóolhaaaaaaa!!!", e cantava as músicas, chorava um pouquinho pelo canto do olho emocionada.
Até bater palma eu bati! Quem conhece, sabe que eu não bato palmas, que eu acho um gesto desnecessário e imbecil. Então. Bati. Alto.

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Nunca vou confessar isso verbalmente ou em voz alta, mas, depois de bater palmas, lá pro final, me deu pena de não ser mal educada e não ter levado a minha câmera.
Não existem fotos desse momento.

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Um mês antes, tinha saído no jornal uma matéria sobre o espetáculo.
Tinha foto, tinha entrevista. Nas entrevistas, os dois bailarinos diziam que o momento mais bonito era quando tudo se transformava no fundo do mar. Eu, quando li a matéria, pensei: "Que bom que eu vou!".
Que bom que eu fui!

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Fora o fato da Ariel e da Aurora parecerem dois travestis, reconheço humildemente que, para patinar no gelo fantasiado de Fera ou como o Gênio da Lâmpada é preciso ser muito macho. A parada é realmente um espetáculo.

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Olívia chegou em casa "apaixonada pelos príncipes", segundo a própria (no que eu não posso discordar; tirando uma ou duas perucas, os moços eram príncipes mesmo), quis ligar pra todo mundo pra contar como tinha sido, dormimos abraçadinhas na minha cama e a paz voltou a reinar no nosso castelo.
Hoje, o encanto dela continua.
Eu fico feliz de poder proporcionar a ela memórias memoráveis; ao mesmo tempo, fico triste por não poder dar o mundo.
Me consola pensar que quem tem o mundo, não tem o que a gente tem.

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