segunda-feira, agosto 27

A torneirinha

Eu nunca achei que fosse ver aquele apartamento tão vazio.
Tão nu.
Tão pequeno.

Este, ao contrário de outros, ficou me parecendo pequeno sem todos aqueles móveis.
Eu nunca havia reparado que no banheiro tinha um arco em volta do espelho. Só reparei porque o espelho não estava mais ali.
Nunca havia reparado nas marcas no chão já sem verniz. Nas manchas de sol. Nas paredes descascadas. Nas cortinas quebradas.
Eu fiquei andando lembrando da minha infância.
Das idas à praia, quando saíamos cheias de cadeiras e barracas.
Das chegadas da praia, quando eu lavava a areia na torneira da garagem. Não tem mais torneira na garagem. Quase corri lá embaixo para lavar os pés uma última vez.
Lembrei de todas as tardes. De todas as noites.
Dos natais e feriados.

Um dia aquela foi uma casa feliz.
Não a mais feliz das casas, mas cheia de lembranças felizes.
Depois ela foi ficando triste.
Velha e esquecida que nem a dona da casa.
No fim, nenhuma das duas andava mais.

Uma morreu.
A outra foi vendida.
A uma nova senhora.
Uma nova senhora que combina tanto quanto a outra com aquele apartamento.
Uma nova senhora com novos filhos e novos netos.
Uma nova senhora que vai reformar e realegrar aquela casa.

Dessa casa novas casas virão.
E eu, que nunca tinha pensado nisso realmente, com vontade, fiquei um pouco espantada demais.
Nunca mais teremos a torneirinha da garagem.

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