quarta-feira, março 21

A minha casa

E nisso, existem sempre problemas que existem, mas que eu não posso resolver de forma prática.

De vez em quando eles me assaltam.

E, hoje, eu me peguei, de novo, pensando na minha casa.
Naquela casa que eu planejo ter há mais de um ano.
Ao invés de ser assaltada pela melancolia da coisa - a melancolia pelo tempo em que eu vou levar para ter ainda essa casa - hoje eu pensei na casa em termos diferentes.
Pensei em tudo que eu ainda tenho que passar para tê-la de fato.
Pensei no prazer que eu vou ter de ter passado por tudo para poder chegar a ela.
Me imaginei, me vi, olhando e falando: caramba, eu consegui.
"Eu tanto quis e tanto fiz que eu consegui. Minha casa. A casa que eu sonho desde...".
E isso me deu um alento...!
Me deu, já, uma sensação boa de conquista.
Me fez acreditar que eu vou conseguir de verdade.
Me deixou na boca o gosto que eu vou ter em tê-la.

Porque a gente vive uma vida complicada, numa cidade complicada.
A vida é difícil. Ponto.
A cidade está em guerra civil.
Ou você se rende, ou convive com ela - e tem medo de um jeito ou de outro.
Eu leio, vejo, escuto casos.

Vivo casos.

Semana passada, uns amigos vieram me deixar em casa.
Assim que o carro encostou, uma patrulinha vinha subindo a rua. Eu desci com um dos meninos e a patrulinha encostou, perguntou aos rapazes o que eles estavam fazendo aqui; não sei se a resposta não foi clara ou o quê, mas um dos PMs resolveu então saltar do carro de arma na mão e vir abordar o carro em pessoa. Eu dizia que eles só estavam me deixando em casa. Devo ter repetido umas duas vezes antes de começar a atravessar a rua de volta e da miha mãe ter, então, aparecido abrindo a janela com um certo barulho. Lá pela quarta vez que eu repetia que eles só estavam me deixando em casa, já com o outro PM do lado de fora do carro, também de arma na mão, pelo mesmo motivo oculto que o cara saiu do carro, ele resolveu voltar. Eles ainda ficaram parados um tempo na rua, e eu, tensa, me despedi com pressa.
Nesse dia, além de todos os meus direitos que já são diariamente violados, me roubaram o direito a um beijo de boa noite.
Eu, como boa carioca que sou, engoli mais essa violação e nada fiz ou falei.

Compreendo o medo deles, veja bem, mas acho absurdo que já abordem amigos meus de arma em punho por causa de uma carona, no meu caso após uma noite de trabalho.

Então, minha mãe vem pedir cuidado agora sempre que eu saio por causa do caso "x" ou do caso "y". Eu não vou deixar de sair. Saio, às vezes, com medo - sempre com cautela - mas não posso deixar de sair.

Também não pretendo envelhecer com esse medo, nem dessa forma.

E ainda há quem ache que eu que estou errada de não querer mais morar aqui.
Que eu que estou errada de querer beijos de boa noite, noites de liberdade, casas ao invés de apartamentos brutalmente protegidos e vigiados, laranjeiras no meu jardim - um jardim.

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