terça-feira, setembro 11

Síndrome de Estocolmo Literária

A vida útil do meu affair com Coraline acabou não perdurando nem até às seis da tarde. Assim que pude, me sentei e devorei o fim da sua história. Fantástica história.
Sou fã, muito fã de histórias de fadas nem tão fadas assim, pouco ortodoxos e mais sombrios. Poderia citar aqui uma meia dúzia de novos e bons contos assim, mas não é esta a intenção no início e quando desta pequena ressalva.
A vida útil do nosso affair durou pouco mais de horas, se formos pôr no papel o tempo que eu gastei para ler e me apaixonar por sua história.
Como meu afã da vez gira em torno destes contos, lá fui eu pesquisar mais um que muito me interessa.
Para minha agonia (ah!), meus escritores de cabeceira adoram escrever muitas e boas histórias, mas também adoram criar personagens magníficos e as sagas deles. Sim, sagas.
A primeira que eu acompanhei não foi realmente uma saga, foi uma novela; e aproposta era de que fosse uma novela e que causasse o que causou não só em mim como em leitores ao longo do mundo todo. Era a famosa e já cinematografada "The Green Mile". Na época, o famoso, o bom e velho escritor, Stephen King, se propôs a lançar um capítulo da novela a cada mês. Foram seis volumes, disputados a tapa no dia em que chegavam às livrarias e lidos com fome neste mesmo dia, deixando-nos todos de-ses-pe-ra-dos a esperar o que viria pelo próximo mês. Hoje, todo mundo já sabe a história e ele já é vendido num único volume. Quem não participou, dançou.
Porém, Mr.King ainda conseguiu me raptar e manter em outra história completamente diferente - não que ele não consiga me raptar e manter de um modo geral, porque sempre que eu acho que já li a maioria das coisas que ele escreveu, ele escreve mais alguma coisa ou reedita outra. E foi assim que, ano passado, sem querer, dei de cara com "A Torre Negra".
No prólogo ele conta que havia começado a escrever a história nos anos de 1970 (data exata eu não lembro nem vou pesquisar porque isto não é um artigo). Esta história, a história do Pistoleiro, já foi concebida e imaginada de forma que coubesse em sete livros (imagino que ele também tenha querido ser Proust em algum nível, bem lá no fundo), mas, que com as coisas da vida, tinha acabado só dando fim a dois volumes. Estes dois volumes, porém, tinham arrebatado seu quinhão de fãs e curiosos sobre o fim e a saga do pistoleiro Roland em busca da sua Torre Negra; e, ao longo dos anos, ele havia recebido uma centena de cartas que lhe imploravam pelo amor de Deus que terminasse de escrever a história ou contasse o final dela antes que as pessoas morressem, por exemplo.
Graças àquele sujeito sem alma que o atropelou tal e qual a enfermeira de "Misery" alguns anos atrás, o homem se viu à beira da morte e resolveu que deveria terminar a história. Satisfação de karma dele e pessoal minha que não fiquei refém tanto assim. Quando eu descobri toda esta história e comprei o primeiro volume dela, restavam apenas dois a serem lançados. A esta altura todos já se encontram confortável e apelativamente piscando para mim nas prateleiras das livrarias de todos os lugares que eu conheço. É com alegria que resolvi, então, às custas de russo ou sem russo na jogada, me encontrar com o Roland e seus amigos de novo e marcar aqui no meu "score" pessoal que já consegui chegar ao quinto calhamaço de novas aventuras.
(Neste caso, em específico, é bem por aí, cada novo volume é maior que o anterior, uma coisa deliciosa e impressionanate!)
Mais dois e o final desta saga, desta longa história de fadas sem fadas, será conhecido e terminado.
Mas eu comecei com essa coisa de sagas e histórias de fadas sem fadas porque, quando estava chegando ao fim de "Coraline", resolvi descobrir a quantas andava outra saga com a qual ando envolvida: oa livros de Abarat.
"Abarat" é um livro genial, lindo de viver. Este, foi escrito pelo Clive Barker, que eu já falei mais cedo.
(Como fica óbvio, eu tenho predileção por estes três sujeitos, que, de maneiras completamente diferentes são tidos como "Mestres do Horror", mas isso já é uma longa discussão para uma mesa de bar, por exemplo, e com uma denominação a qual eu já não sei muito bem se concordo muito.)
Dos três, eu diria que ele é o mais sombrio e violento de todos, de forma que fico muito espantada quando ele escreve algo que denuncie que tem coração e é algo parecido com um ser humano; mesmo assim, ou até por isso mesmo, sou uma leitora ávida das coisas que escreve desde que descobri seus "Livros de Sangue". Assim, descobri que havia um livro infanto-juvenil escrito por ele, o em questão "Abarat".
Abarat é uma terra, não importa, não importa, vá ler o livro; que também foi concebido para ser uma série de livros. Os cinco livros. Só que, mais uma vez, eu não sabia disso!!! Também está explicado no prólogo!!! A diferença está justamente no fato que o homem ainda está escrevendo os livros, que não existe - como não existia para os leitores do Sr. King à época do concebimento d"A Torre Negra" - nenhuma garantia de que ele os irá terminar enquanto eu viver. Ou enquanto ele viver! Imagina se o homem é atropelado por um trem e não termina? Pense na agonia de não ter a certeza de que você poderá saber tudo o que quer saber sobre este mundo encantado e assustador na hora em que bem entender...
Pois, cinco anos depois do primeiro livro, descobri que ele finalmente achou em sua agenda e sua mente ocupada espaço suficiente para lançar lá fora o segundo volume da história. Por um lado eu ganhei o alento de saber que ele não só não deixou de lado a história mágica que inventou, como ainda vendeu os direitos dela para a Disney, que, se Deus quiser, vai exercer lá alguma pressão para que ele termine logo com meu desamparo para poder lançar os filmes - o que implica na tradução e distribuição dos volumes restantes; mas, por outro lado, se o segundo só saiu cinco anos depois, a estatística atual é de que eu só vá terminar de ler os livros de Abarat por volta de 2027, se levarmos em conta os cinco anos de escrita individual mais a tradução e distribuição dos mesmos, o que quer dizer que eu terei que esperar pelo menos mais vinte anos, estando assim, com 50 e poucos anos. Belo prognóstico, não?
Se, por um lado (estou cheia de lados hoje), escapei da espera pela Torre; por outro, caí na espera pela história das restantes ilhas de Abarat. Se, por um, sofrerei com a espera, e talvez morra com histórias não terminadas; por outro, terei a esperança de poder ler as coisas que amo ler por, pelo menos, mais uns trinta anos.
Ser refém de escritores é uma coisa mesmo cheia de lados.
De qualquer forma, que bom que eu sou uma.
E viva a "Síndrome de Estocolmo"!

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