quinta-feira, junho 5

Eu e o Banquinho

Tudo aconteceu quando eu estava perambulando pela minha casa naquele meu ritmo frenético e apressado de hora do banho. Exatamente como eu previa, as lâmpadas da casa começaram a queimar e eu, do alto do meu metro e cinqüenta e oito de altura, não consigo trocar a maioria sem ajuda. O namorado até ajudou a trocar a lâmpada da área de serviço, mas a dita é muito fraca e mal brilha no meio das roupas que estão sempre penduradas no varal. Além do mais, enquanto dona de casa eu tenho uma falha grave – que deve ser culpa dos radicais livres já libertos – que é esquecer de comprar pequenas coisas essenciais para uma casa quando vou ao mercado, como pilhas e lâmpadas.
(Por falar nisso, preciso lembrar de comprar cola. Qualquer cola.)
Assim sendo, lá estava eu no meu ritmo frenético e apressado de hora do banho, indo buscar um pedaço de sabão de coco no quarto de empregada, quando dei uma joelhada daquelas cheias de vontade no banquinho.
Fora o palavrão de praxe, meu primeiro pensamento foi “Merda de banquinho! Pra quê que eu fui inventar de pôr um banquinho aqui?!”, e, antes que eu pudesse responder a mim mesma, me vi pensando no banquinho.
O banquinho foi para a minha casa porque EU quis. Foi para a área de serviço porque EU quis. Ele faz parte da minha herança e das minhas memórias de vida.
Nosso relacionamento começou na casa da minha falecida avó. Lá, o lugar dele era no banheiro. Um enorme banheiro de granito rosa (uma coisa medonha, mas que na época devia ser chiquíssimo), onde ele ficava debaixo do enorme espelho de parede com várias divisórias que escondia os segredos de beleza da vovó. Era nele que a minha tia me botava de pé para me enxugar depois do banho. Onde eu subia para xeretar o armário e ver os cremes, maquiagens e a caixinha de talco da minha avó que eu achava o que há de mais luxuoso no mundo. Onde eu brincava de me olhar no imenso espelho e inventava histórias dentro da minha cabeça que eu era uma princesa ou estrela de Hollywood.
Depois de um tempo, o banquinho passou a ser apenas um lugar para botar as roupas e toalhas que usaríamos depois do banho.
Depois de um tempo, foi a minha filha que começou a ficar de pé em cima do banquinho quando saía do banho e que tinha o prazer de ficar se maravilhando com a descoberta da sua própria imagem refletida no espelho.
Depois de um tempo, vovó morreu. O banquinho, junto com um monte de outros móveis (alguns que são hoje meus móveis) foi para um depósito. Quando eu me mudei e fiz o inventário do que iria querer, reabilitei o banquinho.
Eu não tenho um enorme banheiro de granito rosa, nem vou ter – azulejo rosa vá lá, mas granito é muito cafona, né, não? – então, depois de décadas a serviço da beleza e da imaginação, morando num mundo cheirosinho, a solução foi mudar o cargo do banquinho e mudar o seu lugar de destaque para a área de serviço: um lugar não tão cheiroso, nada imaginativo, mas onde ele desempenha a tarefa não menos importante de ser o lugar aonde eu apóio as roupas para lavar ou guardar.
É uma função de destaque, vamos... Imagina se ele não estivesse ali do meu lado...?
Não é pouco.
Pensando bem, o banquinho me acompanha há 30 anos e faz parte da minha história de vida. Engraçado como um objeto tão bobo quanto um banquinho pode desempenhar um papel tão importante na vida de alguém, não? E, olhando em volta, percebi que existem vários objetos aos quais eu me apego e que também fazem parte da minha vida. E, diante de tudo isso, o que é uma mancha roxa no joelho? Sacanagem xingar o banquinho...

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