segunda-feira, fevereiro 16

R.R., 31, Caracóloga

Depois do período em que eu ficava observando as plantas crescerem, agora eu gasto horas dos meus dias assistindo a vida que passou a existir lá dentro.

Tudo começou com as formigas.
Eram formigas pequenininhas, que andam para lá e para cá tirando pequenos nacos das minhas folhinhas. Como eu tenho o costume de mandar ver um spray de veneno uma vez a cada dois meses, azar o delas.
Ainda assim, pode ser bastante terapêutico ficar espiando aquele povo que vai pra lá e pra cá.

Em dezembro apareceu um caracol.
Apareceu da pior forma possível.
Provavelmente ele já estava lá vivendo na comunidade da minha jardineira, mas nós só nos encontramos num dia em que eu estava tendo um dia muito ruim, muito ruim mesmo e resolvi ir lá dar uma espiada nas plantas. Abri a janela com uma certa fúria e só ouvi aquele "CREC", que, por mais que tenha sido quase inaudível, me pareceu o barulho mais alto do mundo. Quando eu espiei o que era, lá estava ele, meio sem rabo, com a casinha meio esmigalhada, meio pendurada, soltando uma gosma gosmenta do lado de fora da minha janela. E, pelas próximas horas, meu sentimento de culpa por ter massacrado o caracol sem querer e a preocupação com a possibilidade dele continuar vivo foram o estopim para outra coisa muito ruim que eu fiz aquele dia.
Eu ligava pros meus amigos - que, graças a Deus são meus amigos, então não acharam que eu já era caso de internação - praticamente aos prantos dizendo que "ainda por cima eu tinha matado um caracoooooooollllllllll".
Desde esse dia eu passei a procurar o caracol.
Vi que ele se recuperou e passei a tomar o maior cuidado do mundo com o momento de abrir e fechar as minhas janelas.

Semana passada, quando cheguei em casa de noite, além do meu caracol, havia a caracol dele. E eles estavam fornicando. Foi um momento de ápice da minha vida Discovery.
Numa noite pouco depois, pude presenciar o momento em que um deles (eu ainda não sei quem é a moça e quem é o moço, mas me dêem um tempo que eu chego lá) fazia uma manobra arriscadíssima e extremamente nojenta entre a borda da jardineira e a parede da mesma. Ninguém nunca tinha me dito que eles eram tão elásticos.

E assim, sem querer, ganhei dois bichos de estimação.
Entre cachorros, gatos, tartarugas, peixes, eu crio um casal de caracóis.
Minha mãe brinca que eu deveria trocar de carreira, virar Caracóloga.
Eu já penso em comprar uma lanterninha, porque eu fico querendo dar boa noite pra eles, ver se eles estão bem de noite, e não consigo enxergar nada no meio daquele meu matagal.

A pessoa vive 31 anos pra isso.
Virar criadora de caracol.
Foda.

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